14.7.01

Em São Paulo, a serviço. Tempo demais sem escrever, desculpem.
Cheguei na quinta, dia 12, bem a tempo de assistir a palestra de Bruno Rodrigues no evento Interatividades, do Itaú Cultural. Bruno é editor do site da Petrobras e autor do livro Webwriting (Editora Futura). Estudioso do tema desde 1995 e colaborador de diversos sites, entre os quais o Webinsider, ele deu uma palestra muito boa sobre Webwriting e Arquitetura da Informação. Foi extremamente claro e, o mais importante: não escondeu o jogo. Revelou suas fontes, assumiu sua condição de eterno aprendiz (mas com toda a justiça: um aprendiz que é um verdadeiro mestre para todos os que estão começando agora a produzir conteúdo para a Web) e foi de uma sinceridade gratificante ao explicar a questão do webwriting como algo que vai muito além da mera discussão do nome (que muitos recusam por ser em inglês, e preferem utilizar termos como redator de web e quetais) e ao mesmo tempo não tem nada de tão diferente do que se faz em jornais, revistas e outras mídias. É muito bom ver - para variar - alguém que sabe do que está falando e que dá seu recado com precisão. Enfim, gente de conteúdo. Valeu, Bruno.

Falando em conteúdo: não é impressionante como estão surgindo mais e mais sites dedicados a TUDO AO MESMO TEMPO AGORA?? E que conseqüentemente não dizem ao que vieram?
Foco, senhores, foco. Tudo e nada são só dois lados da mesma moeda.

11.7.01

Atendimento ao cliente: Que Atendimento, Cara-Pálida?

Dois momentos na segunda-feira, dia 9: no primeiro, na parte da manhã, liguei para o 0800 da IBM para resolver um aparente problema de compatibilidade. Instalei na semana passada o ViaVoice 7.0, excelente programa de reconhecimento de voz que, se não processa as palavras mais rápido do que eu consigo digitá-las, pelo menos me salva quando a tendinite dá sinal de vida no meu braço esquerdo, e de modo eficiente. Mas - como sempre acontece quando você instala aquele aplicativo de que estava precisando - alguma coisa na minha máquina entrou em conflito. Sintomas: embaralhamento de cores e problemas na reprodução das fontes na tela. Meu Winamp macho e sarado com skin cinza do U2 começou a apresentar um indesculpável conjuntinho duas-peças em azul-bebê e rosa. Como se não bastasse essa saída do armário, todos os meus aplicativos exibiam as fontes truncadas da metade para baixo. Não impedia o trabalho mas incomodava, e muito.
Pois bem, liguei pro 0800. A mocinha educada que atendeu me deu o telefone do suporte do ViaVoice. Telefone este que não era 0800 e tinha o prefixo de São Paulo - e eu moro no Rio. Quer dizer, eu já ia começar pagando a conta. Liguei e fui atendido por um rapaz também educado, que me pediu o número de suporte. Continuei na mesma: ele explicou que era o número estampado no verso do manual. E cadê que eu achava o livrinho? Como não ia ficar gastando meu dinheiro, agradeci e disse que ligaria dali a pouco. Dez minutos depois, manual na mão, torno a ligar. Atendeu-me desta vez uma moça, esta não tão educada quanto os dois atendentes anteriores, que começou a perguntar os meus dados. Ao perguntar se era a primeira vez que eu ligava, respondi a verdade. Em seguida, pediu meu telefone. Dei. Em seguida, a voz meio irritada: "mas seu número não consta em nossos registros". Foi porque eu não o dei da outra vez, expliquei. "Mas como o senhor não deu seu telefone?", a mocinha perguntou inconformada. Tive de explicar que o atendente anterior não me pedira o telefone, apenas o número do suporte. Ela ficou comentando que aquele não era o procedimento correto e eu só pensava naquela famosa resposta em carioquês: E o Quico, minha filha? O Quicotenho a ver com isso? Hein? Hein?
Olhei para o display do telefone. Quatro minutos só de discussão teleológica de procedimentos. Só então ela me perguntou qual o problema. Contei. Resposta dela: "O senhor tem certeza de que é um problema do ViaVoice? Nós nunca registramos esse tipo de ocorrência."
Bom, àquela altura já não adiantava muito discutir. Mesmo assim, respirei fundo e expliquei que meu computador tinha voltado do conserto há menos de um mês, estava funcionando que era uma maravilha e que aquele comportamento
irregular só começara justamente após a instalação do ViaVoice - que coincidência, não?
A única solução que ela pôde me oferecer foi sugerir que eu desinstalasse o programa, reinicializasse a máquina para ver se o problema continuava, e se ficasse provado que o problema havia sido provocado pelo aplicativo, eu poderia tornar a ligar para eles. Depois de gastar sete minutos de ligação interurbana com uma atendente de visível (ou audível, como queiram) má vontade de tentar resolver meu problema, seria meio difícil.
A coisa se resolveu da maneira mais besta possível, que é também como costumam ser resolvidos esses problemas: resolvi verificar no Painel de Controle a configuração das cores, pra ver se pelo menos eu resolvia o problema do Winamp. Tava lá: 256 cores. Como a configuração padrão do Windows 98 é High Color (16 bits), alterei o parâmetro e apliquei.
Acabou que o problema havia sido provocado exatamente por essa alteração maluca na configuração. E ainda paguei uma ligação para resolver o problema sozinho.

Segundo round, como já dizia o saudoso Antônio Fraga (se algum dos meus três leitores não souber quem foi essa figura, volto ao assunto em outra ocasião, ele merece): à tarde, de passagem por Ipanema, parei numa confeitaria da Rua Farme de Amoedo que tem um bolo de cenoura ótimo, dizem até que é uma receita americana premiada. Eu costumava ir lá uma ou duas vezes por semana, fielmente.
Mas no Brasil não existe fidelização de clientes. Para quem não está acostumado, esse neologismo pode parecer bobagem, mas todo cliente que já foi mal atendido - e neste país, quem já não foi? - sabe do que estou falando.
Entrei e me sentei a uma mesa, abri um livro (Marketing de Permissão, do Seth Godin - livro bem legal, estava relendo porque iria entrevistar Mr. Godin no dia seguinte) e esperei.
E esperei.
E esperei.
Detalhe: a loja não estava cheia. E era a quarta vez que isso acontecia comigo.
A terceira vez foi há cerca de um mês. Naquele dia, dirigi-me à gerente, Dona Glória, uma senhora muito gentil mas com um ar, digamos, de superioridade. Perguntei se havia sido grosseiro com algum funcionário dela e ela disse que nunca havia presenciado semelhante coisa (ela está todos os dias na loja, e estava presente nas duas vezes anteriores em que fui solenemente ignorado). Ela me assegurou que isso não tornaria a acontecer. Agradeci e fui embora sem comer nada - mas tomei um café que ela fez questão de me servir por conta da casa. Fiquei satisfeito com a educação dela e aceitei.
Mas eu sou muito otário.
Na vez seguinte em que estive lá, fui atendido na hora, mas julguei ter percebido um olhar incomodado na cara da gerente - a popular "cara de bunda". Pensei com os botões inexistentes da minha blusa Hering: deixa disso, é implicância sua.
Não era não, amigos.
Segunda aconteceu mais uma vez. Fui ignorado solenemente, enquanto quatro outras pessoas que chegaram depois foram atendidas. Desta vez o degas aqui não se intimidou: levantei-me e disse em alto e bom som (e as pessoas que me conhecem dizem que eu tenho um vozeirão, como diria Stanislaw Ponte Preta se vivo fosse, de deixar Fausto Wolff falando fino): "Com licença, mas estas pessoas chegaram na minha frente já foram atendidas e eu não."
O resto da história vocês todos já conhecem: a atendente me olhou com desprezo, disse que eu podia pedir que ela me atenderia, e me atendeu, mas com uma cara de pouquíssimos amigos. Porque quem reclama no Brasil é visto como cria-caso.
Mas eu prefiro a frase de Gonzaguinha: "A gente não tem cara de babaca."
E eu não tenho.

8.7.01

Domingo de sol no Rio de Janeiro. Estou feliz. Brinquei com meu filho, almocei com meus pais, estou aqui agora, curtindo a tarde, trabalhando. E vocês até poderiam dizer: tá vendo só? Trabalhando no domingo! Nem tudo é perfeito, né? Se não fosse pelo fato de que adoro trabalhar. ;-D

Ouvindo Pink Floyd. The Dark Side Of The Moon. Há tempos não curtia esse som. Time, Us and Them, Wish You Were Here (minha favorita desse álbum). Para acompanhar, um suporte nada pós-moderno mas que me cai muito bem: incenso de cânfora no quarto e roletes de madeira embaixo da mesa do computador, para massagear os pés enquanto queimo a vista no monitor (preciso trocar os óculos esta semana, estou me devendo isso desde que fui ao oftalmologista há três meses).

Para não ficar só na narrativa umbilical: além da Comédia Humana estou lendo também a Autobiografia de Um Iogue, do Paramahansa Yogananda. Em 2002 esse livro comemora cinqüenta anos de sua primeira edição, feita pela Self-Realization Fellowship, fundada pelo próprio Yogananda em 1920 para difusão da kriya yoga. Mesmo para quem acha que é bobagem, recomendo: não só não faz mal nenhum ler sobre a vida de um dos maiores iogues de que se tem notícia como desconfio que fará bem. Afinal, o que realmente faz mal nos dias de hoje é essa onda de violência e corrupção, e - o que talvez seja mais aterrador - nossa profunda indiferença à miséria e ao sofrimento humanos.

Há cerca de dois meses o canal de TV a cabo GloboNews exibiu uma ótima entrevista com Eduardo Galeano (autor de As Veias Abertas da América Latina e Nascimentos), onde ele resume brilhantemente esses tempos de Nova Economia: em sua opinião, até meados do século vinte havia um consenso geral da parte das pessoas mais abastadas de que a miséria era uma fatalidade. Ainda que isso não fosse inteiramente verdade (Marx que o diga), havia pelo menos a decência de se perceber que a culpa era do sistema. Hoje a idéia geral - e cada vez mais disseminada nos compêndios de administração e nos livros de como enriquecer fácil - é a de que os pobres estão nessa situação porque não são competentes o bastante para lutar pela vida. Uma idéia que além de burra é covarde e assassina.

A culpa continua sendo do sistema. E a maioria da sociedade prefere se fechar em um cinismo metido a blasé (mas que não passa da mais pura ignorância) e dizer: sempre foi assim, assim sempre será. Não tem jeito.

Desculpem, senhores, mas jeito tem sim. E se grande parte da população sofre, nós que estamos por aqui nesta Rede - jornalistas, bloggers, o que seja, enfim, pessoas que possuem um mínimo de cultura e poder aquisitivo e condições de disseminar informações - podemos fazer a nossa parte. Parando de pensar que o jornalismo de denúncia é, como querem alguns, "jornalismo assistencialista". E deixando nosso cinismo de lado. Vamos ter um pouco mais de consideração e respeito pelo próximo. Porque o próximo somos nós.