30.3.02

Do we have to pay for the web? Quem faz a pergunta não sou eu: é o escritor inglês de histórias em quadrinhos Warren Ellis. Na última edição do BAD SIGNAL, boletim enviado por e-mail, Ellis alerta para a cobrança cada vez mais freqüente de serviços antes gratuitos na Web. Além dos serviços de e-mail do Yahoo, a bola da vez é o Delphi. De 1998 para cá, o Delphi sofreu duas grandes reestruturações para oferecer serviços com funcionalidades adicionais a preços módicos - como está sendo feito agora com o Blogger Pro.

Não há como questionar a necessidade que as empresas que oferecem serviços na Internet têm de ganhar seu dinheiro - afinal, elas fazem por merecer. A questão é: nós podemos pagar o preço?

Esta questão tem sido muito debatida em listas de discussão ultimamente. Há quem defenda a livre iniciativa, ou seja, quem tem capital para se manter sobrevive, quem não tem que saia do caminho. Outros propõem um sistema de apoio e patrocínio que parece ideal, mas que infelizmente - como pode atestar quem tenta viver de teatro neste país - não é uma estratégia das mais recomendáveis.

Seria irresponsabilidade da parte deste lanceiro dizer qual a melhor solução. Até porque nenhuma das alternativas acima me parece a mais indicada. O que é certo, porém, é que quem trabalha merece ganhar pelo que produz. E quem consome deveria dar algo em troca.

Ao fim e ao cabo, a Internet está se tornando uma grande armadilha para quem quer sobreviver (honestamente) às custas dela.

24.3.02

Quando ser otimista é burrice. Talvez por causa das constantes crises econômicas que o brasileiro vive, periodicamente a mídia começa a veicular artigos que pregam que nem tudo vai mal, ou, por outra, que nunca tudo esteve tão bem, que vivemos na verdade no melhor dos mundos, e quem não acredita nisso é pessimista, "do mal" ou é de direita.
Para quem acredita que vivemos num país cor-de-rosa, onde tudo dá certo e estamos sempre para a frente (mas para o abismo, crianças, para o abismo), recomendo a leitura de uma reportagem especial que saiu hoje na Folha sobre o desemprego no país. Abaixo, um dos textos. O resto pode ser lido aqui.


Desemprego triplica; emprego bom cai 35%


Em cinco anos, índices pioram e deixam 12,7 milhões sem ter ocupação


JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO


ESPECIAL PARA A FOLHA


A situação do trabalhador brasileiro é cada vez mais precária. Seja pela dificuldade crescente de arrumar uma ocupação, seja pela perda de qualidade dos empregos disponíveis. A isso soma-se uma queda da renda obtida do trabalho. Esse quadro, já conhecido para as regiões metropolitanas nas pesquisas do Seade/Dieese e do IBGE, revela-se nacional, segundo pesquisa Datafolha, feita entre 19 e 21 de novembro do ano passado. O levantamento, realizado em 126 municípios de todos os Estados do país, ouviu 2.578 pessoas e tem margem de erro de dois pontos percentuais.

Entre 1996 e 2001, o percentual de brasileiros com 16 anos ou mais que se declaram sem ocupação e buscando emprego saltou de 4% para 11%. Projetando-se esses valores para o universo da população pesquisada, vê-se que o número de desempregados foi triplicado, de cerca de 4 milhões para 12,760 milhões. Apenas o novo contingente de desempregados surgido nesses cinco anos equivale às populações do Rio de Janeiro e de Belo Horizonte.

Mas não é apenas a quebra sucessiva de recordes de desemprego que tem aumentado a precarização do trabalho no Brasil. O emprego formal, seja o registrado em carteira ou o oferecido pelo funcionalismo público, sofreu perda significativa desde 1996.
Segundo o Datafolha, o percentual de brasileiros que vivem de bicos ou de trabalhos esporádicos (free-lance) cresceu de 13% para 16%, equiparando-se ao percentual de assalariados registrados, que caiu de 22% para 16% nesses cinco anos. Os funcionários públicos, que eram 9% da População em Idade Ativa (PIA) em 1996, somam agora apenas 5%. Também os autônomos regulares, aqueles que pagam ISS (Imposto Sobre Serviços), estão em queda: passaram de 9% para 5% no período.

O único segmento que se manteve estável foi o dos assalariados sem registro, cujo percentual passou de 11% para 10%.
Em outras palavras, se fôssemos dividir esses tipos de ocupação entre estáveis e precárias, o primeiro grupo, formado por assalariados registrados, servidores públicos e autônomos regulares, encolheu de 40% da PIA em 1996 para 26% em 2001. O grupo dos ocupados em situação precária aumentou de 24% para 26%. Ou seja, apenas metade da força de trabalho ocupada no Brasil tem garantias mínimas. Nesses cinco anos, cerca de 16 milhões de brasileiros perderam os direitos associados ao fato de terem uma ocupação estável.

Além de dar menos direitos, a informalidade paga pior. Um assalariado registrado ganha em média R$ 551,80, segundo o Datafolha. Quem vive de bico recebe R$ 393,20, e o assalariado sem registro, ainda menos: R$ 286,30. A pesquisa mostra que a precarização varia conforme a região do país. A situação é muito pior no Nordeste, onde a soma de desempregados e trabalhadores em ocupações precárias chega a 41% da PIA, do que no Sul, onde esse percentual é de 31%.

Quem sobra com essas ocupações piores, com maior frequência, são as pessoas com menor escolaridade (21% dos que estudaram até o ensino fundamental vivem de bico), as de cor parda ou negra, e as que vivem fora das regiões metropolitanas. Os setores da economia nos quais o problema é mais crítico são a agropecuária e a construção civil, cujos percentuais de ocupados em ocupações temporárias é de 45% e 51%, respectivamente.

Essa transformação do mercado de trabalho brasileiro em tão curto período tem diversas explicações, que variam segundo a tendência ideológica do especialista. Mas, como regra geral, elas passam pelo aumento da inserção brasileira na economia global (o que implicou aumento de importações e fechamento de vagas, principalmente na indústria) e por taxas de crescimento inferiores às necessárias para o país encaixar os milhões de jovens que chegam anualmente ao mercado de trabalho.


Pois é. Agora me provem que quem tem competência se estabelece.